Jornal O TEMPO: Teatro em todas as praças de Minas

Grupos de teatro do interior fazem arte apesar dos desafios e das adversidades

 

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Na rua. Grupo Teatro da Pedra, de São João del Rei, atua há mais de uma década na cidade e,
agora, organiza temporada anual
 
Por Aline Gonçalves

O teatro pelo interior de Minas vive e resiste. Mesmo com queixas sobre falta de recursos e equipamentos culturais, produtores, diretores e atores, que vivem em diferentes pontos do Estado, organizam-se e produzem montagens ano após ano.

Para quem mora em BH, essa cena parece distante, mas as companhias estão sempre em movimento, inclusive realizando festivais, em rede, que visam fomentar a arte. O crescente pedido de registro de profissionais no Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões do Estado de Minas Gerais (Sated-MG) é indício da persistência. Dentre as cidades citadas pelo órgão como expressivas estão São João del Rei, Barbacena, Divinópolis, Santa Bárbara, Ipatinga, Juiz de Fora, Teófilo Otoni, Uberlândia e Araxá (veja abaixo).

“Temos feito mais bancas de capacitação no interior porque as pessoas dessas cidades estão vislumbrando uma forma de expressão de sua criatividade profissionalmente”, comenta a presidente do Sated, Magdalena Rodrigues. “A verdade é que se faz teatro em Minas inteira, e, de uns anos para cá, percebemos que os grupos estão mais organizados, inclusive fazendo mais propostas para captação de recurso”, diz.

Em Barbacena, onde nasceu um dos grupos mais conhecidos, o Ponto de Partida, com quase 40 anos, há, por exemplo, um grupo de formação organizado pela Cia. Elas por Elas: trata-se do Rotunda. “Fazemos montagem com os alunos, aplicamos a teoria, e por meio dela surge um espetáculo. Neste ano, eles vão encenar Nelson Rodrigues”, diz Cláudia Valle, fundadora do grupo. “A nossa visão é buscar editais e leis como apoio, mas também sobrevivemos, se preciso, com ingressos e oficinas”, diz ela. A companhia faz apresentações mensalmente.

Apesar de as montagens se espalharem por diferentes cidades, não há uma temática que as aproxime, observa Magdalena. “O que existe é fazer arte. Obviamente, cada grupo tem suas características locais. Não são melhores nem piores que as de BH. A diferença é que, em geral, a capital tem uma instrumentalização maior”, diz. Segundo ela, um dos grandes desafios é mudar a mentalidade, inclusive entre os próprios artistas, sobre essa qualidade estética dos grupos do interior. “Eles podem estar prejudicados pela divulgação, mas não pelo tipo de manifestação artística que oferecem. Ocorre que muitos gestores das políticas públicas às vezes preferem contratar uma dupla sertaneja, artistas de fora a cachês exorbitantes, sendo que, com pouco dinheiro, conseguiriam fomentar as companhias locais. É um problema da valoração e da valorização da cultura local, que possibilitaria inclusive que as companhias saíssem dos muros de onde nasceram”, diz.

Mesmo com pouco apoio ou recursos governamentais via Fundo Estadual de Cultura, as companhias tentam, por si mesmas, atravessar essas fronteiras, e encontram nos festivais uma alternativa. “Montamos o primeiro em 2000, quando começamos com o Festival de Artes Cênicas de Conselheiro Lafaiete (Face)”, conta o produtor cultural Geraldo Lafaiete. Segundo ele, outros eventos, como os de Guaranésia, Patrocínio e Araguari, vieram a partir daí. “Nosso objetivo sempre foi a manutenção dos grupos do interior. Hoje, nos encontramos praticamente a cada 30 dias em diferentes lugares”, diz ele ao falar do calendário de eventos. Neste ano, a edição do Face, por exemplo, foi em junho, reuniu 46 grupos e 25 mil pessoas. “Esse circuito de festivais dá vida útil às companhias, justifica o trabalho”, diz.

O diretor André Luiz Dias, do grupo Instituto Cultura In-Cena, é um dos organizadores do Festival Nacional de Teatro de Teófilo Otoni, Festto, e também pontua sobre a importância desses eventos. “Hoje o grupo comemora dez anos de trabalho (já são oito montagens profissionais), e temos que celebrar, porque estamos no Vale do Mucuri, uma região carente de equipamentos de fomento, mas vamos ocupando os espaços possíveis. A arte precisa ser feita em qualquer lugar”, conta. O grupo acaba de estrear “Às Margens”, peça que fala justamente sobre os esquecidos (as apresentações em BH já estão marcadas para setembro). “Fazemos teatro, sendo que a cidade nem sequer tem um teatro”, diz.

A queixa em relação aos espaços físicos é mesmo frequente, e a Secretária de Estado de Cultura de Minas Gerais sabe disso. “Temos oferecido apoio técnico em relação às reformas e melhoria de qualidade instrumental destes por meio da Lei de Incentivo. Sabemos que há uma reivindicação grande”, diz o secretário Angelo Oswaldo. “Além disso, procuramos sempre ter uma ação afirmativa de apoio e estímulo às companhias, com diálogo, parcerias, porque sabemos da importância dessa movimentação”, diz.

O sonho de ter um cantinho próprio foi realizado pela Trupe Ventania, de Passos. “Desde 2004, estamos no Teatro Rotary. Agora, estamos preparando uma montagem com estreia para o ano que vem”, conta a produtora Isabella Vieira. Em São João del Rei, o grupo Teatro da Pedra criou sua sede do zero, em 2015, após 11 anos na cidade – os fundadores vieram de São Paulo à procura de um local com mais qualidade de vida. “O espaço é importante para organizarmos uma programação. Fizemos a nossa primeira temporada no ano passado e, agora, estamos com tudo lotado”, conta um dos fundadores, Juliano Pereira.


Teatro das Gerais

Veja alguns dos grupos e festivais que se destacam no interior de Minas

São João del Rei

FOTO: Marlon de Paula/Divulgação
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O grupo Teatro da Pedra foi fundando em SP nos anos 90 com o nome de ManiCômicos e se estabeleceu na cidade há 12 anos. Em 2016, inaugurou sua sede própria. Desde então, tem trazido companhias convidadas e apresentado suas montagens regularmente. A temporada 2017 vai até outubro.

Juiz de Fora
É nesta cidade que está o Close Formação Artística, tradicional escola de formação para dramaturgia, especializada na capacitação de atores, com mais de 15 anos de atuação. Anualmente, os estudantes realizam um festival com as peças de conclusão de curso, sob direção de Trajano Amaral.

Passos
A Trupe Ventania foi fundada há cinco anos pelo diretor Maurílio Romão e já tem dez montagens. Desde 2014, sua sede é o Teatro Rotary. Organizou, em junho, o 1º Festival Nacional de Teatro em Passos, que reuniu 25 grupos expressivos, como o Galpão, e atingiu 20 mil pessoas.

Barbacena

FOTO: ERIC STEFANI FOTGRAFIAS/Divulgação
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É a casa do grupo Ponto de Partida, com 37 anos, que estreia espetáculo “Vou Voltar” no dia 11 na cidade (em BH, no dia 18). Além disso, há outros projetos importantes, como o Rotunda, da Cia. Elas Por Elas, com 16 anos de existência e 16 montagens, que atua para a profissionalização do setor

Conselheiro Lafaiete
Tem um dos eventos de teatro mais antigos de Minas, o Festival de Artes Cênicas de Conselheiro Lafaiete (Face), que chegou a sua 17ª edição neste ano, organizado pelo Centro Cultural Casa do Teatro. Surgiu com a ideia de promover o diálogo e o intercâmbio entre os artistas que vivem longe da capital, fomentando o setor. Foi responsável por motivar a organização de outros festivais, como o de Guaranésia e o de Patrocínio. Neste ano, reuniu 25 mil pessoas.

Teófilo Otoni
O Instituto Cultural In-Cena é um dos grupos mais atuantes e organiza o Festival Nacional de Teatro de Teófilo Otoni (Festto) desde 2012. Também na cidade está a Insólito Cia. de Teatro, que existe há cinco anos e neste semestre programou apresentações em Poté, Malacacheta, Ataléia, Itambacuri, Ladainha, Setubinha, Catuji, Itaipé, Novo Oriente de Minas e Franciscópolis. Em outubro, há a segunda edição do Festival Infantil de Teófilo Otoni.

Uberlândia

FOTO: Thaneressa Lima/Divulgação
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O principal grupo local é o Grupontapé de Teatro, criado em 1994, durante a montagem do espetáculo “A Mulher Sem Pecado”, de Nelson Rodrigues (tem mais de dez produções no repertório). Também mantém uma escola livre de artes cênicas, promovendo oficinas. Na sede do grupo, ocorrem apresentações frequentes de convidados.

DIVULGAÇÃO: JORNAL O TEMPO

 

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